Silvio Augusto de Bastos Meira, nome literário Silvio Meira, advogado, professor Catedrático e Emérito da UFPA, jurista, jurisconsulto, humanista, germanista, romancista, escritor. Homem de todas as letras. Filho do senador Augusto Meira com Anésia de Bastos Meira, nasceu em Belém do Pará no dia 14 de maio de 1919. Em 1924 iniciou os estudos primários no “Instituto Vieira”, concluindo em 1929. No ano seguinte, aos 11 anos, ingressou no Gynásio Paraense (Colégio Paes de Carvalho), onde organizou um jornal intitulado “Nihil”, com seis exemplares. Em 1935, aos 16 anos, termina o curso ginasial e realiza o curso pré-jurídico, quando inicia os estudos na língua alemã com a professora Otília Müller Schumann. Aos 18 anos escreve seu primeiro livro, “A conquista do Rio Amazonas”, onde conta a história do navegador Pedro Teixeira e, aos 19, escreve seu primeiro romance “Mato Grande”, inédito até hoje, quando, também, teve publicado no importante “Jornal do Commercio” um trabalho sobre Frederico Schiller, de sua autoria. Em 1937, ingressa na Faculdade de Direito do Pará. Em 1940, ainda acadêmico de direito, realiza concurso para o Ministério do Trabalho, conquistando o primeiro lugar entre 400 candidatos, assumindo como secretário do Tribunal Regional do Trabalho. Gradua-se em direito no ano de 1942, com o título de “laureado”, sendo o orador oficial da turma. Em 1943, desliga-se do Tribunal do Trabalho e é nomeado diretor da Junta Comercial do Estado do Pará. Inscrito na OAB-PA sob o nº 305, foi advogado militante por mais de 30 anos. Completou seus estudos humanísticos em bolsa de estudos na Alemanha, França e Itália, nos anos de 1957 a 1962. Em todas as missões ao exterior manteve contato pessoal com eminentes romanistas, tendo várias de suas obras traduzidas para vários idiomas.
Projetou-se no Pará como legislador (constituinte de 1946), presidente da Comissão que elaborou o projeto da Constituição Política do Estado em 1947 e membro da que elaborou a de 1967, presidente da Comissão de Constituição e Justiça, contribuiu para a redação do Código Civil de 2002, presidente do Instituto dos Advogados do Pará (IAP) e vice-presidente da OAB-PA na gestão de Daniel Coelho de Souza e Egydio Salles. Silvio Meira também foi deputado estadual (líder da maioria), consultor geral da Prefeitura de Belém, consultor geral do Estado, membro do Conselho Estadual (desde a sua fundação em 1969) e do Conselho Federal de Cultura (1971 a 1977), bem como 1º suplente de deputado federal e de senador da República.
Além dos inúmeros cargos que exerceu, era membro de várias entidades culturais, nacionais e estrangeiras, tais como a Academia Brasileira de Letras Jurídicas (fundador, na cadeira nº 05), Academia Brasileira de História, Instituto dos Advogados Brasileiros (de onde foi Orador Oficial por muitos anos), Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (e de vários Estados, como o do Pará), Academias de Letras (Carioca, Pará, Acre, Paraíba, Alagoas e outras), Academia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil, Sociedade Brasileira de Romanistas, foi presidente da Associação Interamericana de Direito Romano, bem como membro honorário da Academia Paraense de Letras Jurídicas. Com mais de cinquenta títulos e diplomas honoríficos, entre eles o diploma “Al Mérito” da Universidade Autônoma e da Universidade Veracruzana do México, “Palma de Ouro” da UFPA, “Ami de Paris”, do Conselho Municipal de Paris, “Medalha do Mérito” da Universidade Federal de Pernambuco e “Medalha Osvaldo Vergara” da OAB-RS. Recebeu quatro prêmios da Academia Brasileira de Letras (Odorico Mendes, Aníbal Freire, Alfredo Jurzikowsky e a mais alta comenda cultural brasileira, a “Medalha Machado de Assis”, pelo conjunto da obra). Nas Letras Jurídicas, é o único paraense a receber as três maiores comendas do país: o “Prêmio Pontes de Miranda”, da Academia Brasileira de Letras Jurídicas (1980), o “Prêmio Teixeira de Freitas”, do Instituto dos Advogados Brasileiros (1971, indicado por 36 juristas) e o “1º Prêmio Brasília de Letras Jurídicas”, do Clube dos Advogados do Distrito Federal (1977). Nos anos 70, cursou a Escola Superior de Guerra, sendo orador da turma.
Como professor, em 1947 foi contratado para lecionar Direito Civil e, em 1955, começou a lecionar Direito Romano, conquistando a Cátedra da disciplina em 1958 com a tese “A Lei das XII Tábuas – Fonte do Direito Público e Privado”. Em 1989, foi elevado a professor Emérito da UFPA. Silvio Meira, sobretudo, era um germanista. A convite do governo alemão estudou e visitou as universidades de Bonn, Hamburgo, Berlim, Munique, Bochum, Heidelberg, Constanz, Instituto Max Planck, entre outras. Traduziu, do original, a obra-prima “Fausto” de Goethe, em versos rimados (5 edições), merecendo por essa tradução os aplausos de eminentes homens de letras brasileiros. Traduziu, também, o drama “Guilherme Tell”, de Frederico Schiller (2 edições), sendo premiado pela Academia Brasileira de Letras. Sobre a cultura tedesca, ainda publicou a bela obra “Estudos Camonianos e Goethianos”. Pelas suas realizações no campo germanístico recebeu a mais alta comenda cultural alemã, a medalha “Verdienstkreuz”, a Cruz do Mérito da antiga República Federal da Alemanha, em 1ª classe. Sobre a tradução do Fausto feita por Silvio Meira, escreveu o saudoso Carlos Drummond de Andrade: “Não preciso dizer-lhe do interesse que me despertou a recriação, em vernáculo, da obra-prima alemã, interpretada com tanto escrúpulo intelectual e conhecimento de particularidades literárias, que tornam esse trabalho realmente digno de admiração”.
Silvio Meira publicou inúmeras obras nas áreas do Direito, literatura, poesia, ensaio, biografia, tradução e romance, mais de duzentas monografias, artigos e conferências por todo o mundo e mais de quinze mil pareceres jurídicos. Na semana passada já tratamos das obras germanistas, abordando a tradução do “Fausto” de Goethe e o drama “Guilherme Tell”, de Schiller, ambas premiadas como a melhores traduções para a língua portuguesa. Aliás, sobre o caráter germanista de Silvio Meira assim pronunciou-se a saudosa escritora Racquel de Queiroz, a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras: “Silvio Meira é um goethiano, cultor e tradutor do Poeta. Isso se compreende, pois as afinidades entre ambos são evidentes, como a multiplicidade de facetas intelectuais, que no paraense descobrimos na cátedra, na ciência, na linguística, na poesia, no romance. E cada qual tão merecedora de aplausos quanto a obra”. Mas, Silvio Meira era, também, um romancista. Sua famosa trilogia “Os Náufragos do Carnapijó”, “O Ouro do Jamanxim” e “Os Balateiros do Maicuru”, que retratam a vida na Amazônia, eram obras obrigatórias nas escolas públicas do país pelo INL – Instituto Nacional do Livro. Aliás, sobre “O Ouro do Jamanxim”, pronunciou-se o grande Carlos Drummond de Andrade: “…belo e vigoroso romance O Ouro do Jamanxim. Ele nos permite visualizar, de forma dramática, a terra e o homem amazônico, através de uma história que cativa o interesse do leitor. Ficção que reflete a vida em movimento, e que por isso, a par do mérito literário, tem o valor de documento social e humano”.
No campo da história, Silvio Meira escreveu “A Conquista do Rio Amazonas”, “A Epopéia do Acre”, “Fronteiras Sententrionais: 3 séculos de lutas no Amapá”, “Fronteiras Sangrentas”, “Meditações sobre o Fausto de Goethe” (separata) e “Mato Grande” (inédito). Sobre a obra “Fronteiras Sangrentas”, assim comentou o saudoso intelectual Gilberto Freyre: “…o erudito admirável, cujo alto saber nunca se desprende das coisas mais nacionais do Brasil, que é o Prof. Silvio Meira”. No campo da poesia, publicou “Antologia Poética”, “Antologia de Poetas Alemães” (26 poetas), e os ensaios “Estudos Camonianos e Goethianos” – onde faz uma profunda análise comparativa entre o pensamento de Goethe e Camões -, “Andrés Bello e Teixeira de Freitas” e “A missão do orador”. Sobre as Antologias Poéticas, assim escreveu o saudoso escritor Octávio de Faria, imortal da Academia Brasileira de Letras: “Silvio Meira é um ser vivo e pulsante, ao mesmo tempo um romancista, e um poeta, um jurista e um ensaísta, um ser que vibra como todos ante tudo o que existe e se faz sentir no tremendo mundo em que vivemos. Apenas, e antes de mais nada, é um ser voltado para o que há de mais belo e de mais nobre, para o passado mais clássico em cujo culto foi educado – e, digamos assim, esplendidamente educado”.
Na área do Direito, foi autor de inúmeras obras, artigos, conferências e trabalhos científicos ao longo da vida, especialmente na área romanista, os quais destacamos: “Curso de Direito Romano” (reeditado em 1996 pela LTr em edição comemorativa), “História e Fontes do Direito Romano”, “Instituições de Direito Romano” (um tratado, reeditado em 2017 pelo IASP), “Direito Tributário Romano” (reeditado em 2013 pela Ed. UFPA), “A Lei das XII Tábuas – Fonte do Direito Público e Privado” (sua tese de Cátedra), “Novos e Velhos Temas de Direito”, “O Direito Vivo”, “Noções Gerais de Processo Civil Romano”, “Processo Civil Romano”, “Temas de Direito Civil e Agrário”, “A vocação dos séculos e o Direito Romano”, “Alguns Casos Forenses”, “Direitos de ontem e de hoje”, “Rui Barbosa na Constituição de 1988”, “O Brasil e o Direito Romano”, “O Tribunato da Plebe em face do Direito Romano”, entre tantos outros. Suas obras foram publicadas pelas melhores editoras do Brasil e do exterior. Notabilizou-se com o lançamento das biografias dos dois maiores juristas do Brasil: “Clóvis Beviláqua – Sua Vida, Sua Obra” e “Teixeira de Freitas – O Jurisconsulto do Império”, ambas premiadas, deixando, ainda, a obra “Couto de Magalhães, o último bandeirante” (inacabada). Sobre a biografia de Teixeira de Freitas, assim escreveu o saudoso Afonso Arinos de Melo Franco, titular da cadeira 25 da Academia Brasileira de Letras: “Agora, com este livro monumental sobre Teixeira de Freitas, o humanismo de Silvio Meira adquire nova dimensão, a de biografia, no seu sentido abrangente de ensaio jurídico, pesquisa histórica, reflexão social e compressão humana”. Silvio Meira compôs inúmeras bancas de mestrados, doutorados, cátedras e livre docências em diversas universidades da Europa e da América Latina, muitas delas na USP. Em 2017, a Universidade da Amazônia batizou a biblioteca do curso de direito com o seu nome.
Silvio Meira casou-se com Maria José Martins Meira (in memoriam) e teve sete filhos, Aluisio, Maria Silvia, Arnaldo (in memoriam), Heloisa, Celso (in memoriam), Fernando (in memoriam) e Henrique. Dedicou-se também à arte, especializando-se em pintura na França. A música, que ele tão bem retratava no piano “Essenfelder” de cauda longa, também fazia parte dos seus hobbies desde a infância. Falava e escrevia fluentemente mais de oito idiomas, entre eles o latim, alemão, francês, espanhol, italiano, inglês e grego. Silvio Meira faleceu no dia 31 de dezembro de 1995, em Londres/Inglaterra, depois de retornar de uma conferência em Bruxelas. Foi toda uma vida dedicada à cultura, ao trabalho, à família e à pátria.